O dia em que o uivar de lobos levou uma platéia ao transe
Conheça este curioso caso.
– Por que o uivar de lobos causou transe na platéia?
– Qual a diferença entre transe e êxtase?
– A ciência neurobiológica pode explicar o transe?
– Como explicar o transe de uma seita religiosa?
O dia em que o uivar de lobos levou uma platéia ao transe
Por: Silvia Helena Cardoso
Aconteceu em uma igreja de Nova York. Um concerto suave e harmonioso combinava uma gravação de uivos de lobos. De repente, um membro da audiência se levantou, olhou para cima e começou a uivar junto com os lobos. A platéia contagiada, logo fez o mesmo. E aquele clima os levou a um estado de transe (2, 3).
Por que afirmar que aquilo foi um transe e não e efeito da própria música, ou mesmo um êxtase?
O transe, de acordo com Roget (1), é um estado alterado da consciência obtido por meio de um evento sônico, agitação e a presença de outros. Em contraste, o êxtase, é alcançado no silêncio, imobilidade e solidão. A música, por sua vez, é somente mais um dos muitos componentes que causam o transe. Frequentemente ela é um dos elementos essenciais, mas outros fatores culturais estão envolvidos também. Estes fatores variam de sociedade para sociedade. Em uma sociedade, o desencadeamento do transe pode ser feito por uma música baixa, suave ou lenta, e em outra, por uma música alta, agitada ou rápida.
Como explicar o transe em nível neurobiológico?
Newberg, d’Aquili & Rause 2001(2) sugerem que a estimulação rítmica repetitiva dos uivos levou a uma estimulação das respostas autonômicas e límbicas. Os pesquisadores afirmam que o transe pode ser induzido neurologicamente de duas formas: de “baixo para cima” (primariamente por meio do sistema nervoso) ou de” cima para baixo” (primariamente por meio do cérebro)(2).
Induzir o transe de baixo para cima envolve o sistema nervoso autônomo o qual tem dois componentes: o simpático (um subsistema excitatório) e o parasimpático (um subsistema “aquietado”). O sistema nervoso autônomo conecta o cérebro com o resto do corpo e exibe um papel chave em gerar emoções básicas como medo e alegria. O simpático ajuda o ser humano a se adptar a estímulos benéficos e danosos no ambiente.
Este subsistema pode por exemplo, aumentar a freqüência cardíaca, pressão arterial, e respiração. O parasimpático mantém a homeostase e conserva a energia do corpo. Ele controla relaxamento, sono, crescimento celular, digestão. Em outras palavras, ele é responsável pelas funções vegetativas e atividades de manutenção. Estimular os sentidos (por ex., bater palmas vigorosamente, ouvir um tambor, etc) ou aquietar (como aconetce no sono normal, canto, recitar um mantra, etc), é possivel produzir uma breve mas intensa experiência de transe.
Algumas seitas religiosas experimentam o transe. A percepção de alguns adeptos que acreditam estar assistindo a outro adepto, ou mesmo ele próprio estar “incorporado pelo demônio” pode, possivelmente, ser explicada pela estimulação rítmica repetitiva dos sons (tambores, voz do pastor, gritos), que leva à uma estimulação excessiva e anormal das respostas autonômicas (movimentos excessivos e descoordenados) e límbicas (perda do controle emocional), somado aos estados alterados mórbidos da consciência e à forte crença religiosa.
Este fenômeno parece levar ao que se conhece por “histeria coletiva”, uma psicopatia cujos sintomas se baseiam muito nestas reações: alterações de comportamento por falta de controle sobre atos e emoções, ansiedade, sentido mórbido de autoconsciência, exagero do efeito de impressões sensoriais, e por simulação de diversas doenças e incorporações espirituais.